BRASIL: Economistas veem menor coordenação entre Fazenda e BC
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- Criado em Terça, 30 Abril 2013 08:55
No momento em que o Banco Central eleva o tom em relação às preocupações com a inflação e dá início a um novo ciclo de aperto monetário, o governo afirma que ainda não há clara trajetória de recuperação da atividade e que, portanto, os gastos governamentais devem ser no sentido de estimular a economia. As declarações feitas pelo secretário do Tesouro Nacional, Arno Augustin, ao Valor, foram interpretadas por economistas como sinal de que há menor coordenação entre a autoridade monetária e o Ministério da Fazenda, o que pode sobrecarregar a política monetária, afirmam.
Gastos públicos - Em entrevista ao Valor, Augustin disse que os gastos públicos passarão a ser guiados pela economia, e não mais pela relação dívida pública/PIB. Para especialistas em contas públicas, a política fiscal ajustada aos ciclos econômicos é uma boa ideia, já adotada por outros países, mas é preciso que o governo explicite quais são os parâmetros a serem seguidos.
Estímulo - Augustin disse ainda que neste momento, em que ainda não há clara trajetória de recuperação da economia, a política fiscal tende a ser no sentido de estimular a atividade. O Banco Central, por outro lado, deu início a um ciclo de alta da taxa básica de juros e afirmou, na ata da última reunião do Copom, que "informações recentes apontam para a retomada do investimento e para uma trajetória de crescimento, no horizonte relevante, mais alinhada com o crescimento potencial". Para Fernando Rocha, sócio da JGP Gestão de Recursos, as posições distintas passam a impressão de maior descoordenação entre o BC e o Ministério da Fazenda, já que o primeiro estaria preocupado com a inflação e o segundo, com a atividade.
Política fiscal - Ao tentar ativar a demanda por meio da política fiscal, o governo, diz Rocha, tende a neutralizar o efeito da política monetária sobre a atividade, o que poderia exigir uma alta maior da Selic para que a inflação caminhe para o centro da meta. O quadro é distinto do observado em 2011. Naquele momento, a arrecadação forte permitiu que o governo elevasse a meta de superávit primário em R$ 10 bilhões, o que abriu espaço para que, em agosto, o BC reduzisse juros.
Sinais confusos - Além disso, as declarações de Augustin, afirma o economista Mansueto Almeida, parecem enviar sinais confusos ao BC. Segundo o especialista em contas públicas, as declarações parecem ser mais um esforço do governo de "enganar o Banco Central", no sentido de induzir a autoridade monetária a manter a expectativa de superávit primário de 3,1% do PIB em seu horizonte de juros.
Anticíclica - Para Alexandre Schwartsman, ex-diretor do BC, a política fiscal irá puxar para um lado e a monetária, para o outro. "A história de que a política fiscal é anticíclica só serve para diminuir superávit primário. Só temos política anticíclica quando o crescimento é baixo."
PIB potencial - Para que a política fiscal seja ajustável aos ciclos econômicos, é preciso estimar o PIB potencial, um conceito controverso que estabelece a capacidade de crescimento de um país sem gerar pressões inflacionárias. Para o BC, esse número está em torno de 3%. "Não é possível ter um PIB potencial para a política fiscal e outro para a monetária", diz José Roberto Afonso, especialista em contas públicas.
Lei de Responsabilidade Fiscal - Em sua opinião, a Lei de Responsabilidade Fiscal sempre permitiu que o governo fizesse política fiscal anticíclica, já que as metas estabelecidas na Lei de Diretrizes Orçamentárias podem ser alteradas, desde que o governo preste contas para o Congresso. "O problema está na prática. Nesse caso, a definição do PIB potencial e do cenário macroeconômico são cruciais". Estabelecer uma meta, mesmo que menor do que os atuais 3,1% do PIB, também é melhor do que uma banda, diz. Mansueto concorda. "Eu prefiro trabalhar com uma meta menor do que com um número que pode ser 0,9% ou 3,1%, e que ninguém sabe qual é".
Ajuste ao ciclo econômico - Marcio Garcia, pesquisador visitante na Sloan School of Management do MIT, também avalia que Augustin dá a entender que quer uma política fiscal ajustada ao ciclo econômico, mas não se compromete com números.
Maior transparência - Para Francisco Luiz Lopreato, professor do Instituto de Economia da Unicamp, as declarações do secretário do Tesouro Nacional apenas explicitam o que já vinha sendo feito e conferem maior transparência à comunicação do governo. "Agora podemos nos preocupar com uma política de caráter mais anticíclico, já que a economia está com nível de crescimento muito baixo", diz. "Se a economia voltar a crescer, podemos pisar um pouco no freio". (Valor Econômico)