ARTIGO DE OPINIÃO: Uma via de mão dupla

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Eduardo Sciarra (*)

A retração da economia brasileira, acusada na mais recente pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), deve ser interpretada como um sinal de alerta pelas autoridades que cuidam da política econômica do País. De acordo com o estudo feito pelo IBGE, o Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro caiu 1,2% no terceiro trimestre deste ano na comparação com os três meses anteriores. Um dos motivos para a queda foi o desempenho negativo do PIB agropecuário, que ficou 3,4% abaixo do verificado em abril, maio e junho. Em 2003, o agronegócio registrou crescimento de 6,54%, elevando o PIB brasileiro. Os números do IBGE evidenciam a estreita relação: quando o agronegócio vai bem, o PIB brasileiro também vai bem. Um é reflexo do outro. Razão pela qual o agronegócio brasileiro precisa ser tratado como prioridade, se o País quiser uma economia forte.

Os números por si só mostram sua força. O agronegócio brasileiro representa hoje um terço do PIB nacional - entendendo-se o PIB nacional como a soma de todas as rendas e serviços do País durante o ano - e 40% dos empregos gerados no Brasil. As estimativas são mais reveladoras quando analisamos as exportações e as importações. O saldo positivo da balança comercial de 2005, diferença das exportações sobre as importações, deve fechar em 43 bilhões de dólares. Esse superávit deve-se em boa parte ao agronegócio, que responde em média por 39% do total das exportações realizadas pelo País. Então como explicar a escassez de investimentos do Governo Lula em infra-estrutura e logística que garantam corredores de escoamento mais eficientes e a falta de visão estratégica? É certo que o agronegócio, atualmente, não está no topo das prioridades do Palácio do Planalto, apesar de ser um dos mais competitivos do mundo, resistir a uma política desigual de subsídios implantada por países desenvolvidos, e alavancar a economia.

A agricultura e pecuária brasileiras sofrem com essa visão limitada e pagam por ela. Em meados deste ano, os agricultores brasileiros, numa prova de mobilização, levaram seus tratores para Brasília num sinal de descontentamento contra o Governo Lula. Amargando os prejuízos com a forte estiagem, com a redução dos preços no mercado, e com o aumento exagerado dos insumos, reivindicaram nada mais que o justo: a renegociação de suas dívidas, a redefinição dos preços mínimos de alguns produtos, juros menores, e mais recursos para a safra 2005/2006. Não por má vontade do Ministério da Agricultura, o governo federal demorou em agir e as conseqüências da lentidão não poderiam ser piores: o produtor brasileiro colheu menos e vendeu a sua safra por valores mais baixos.

A valorização do real perante o dólar, o que reduziu a competitividade da produção nacional, e a queda de renda, a mais contundente registrada nos últimos 10 anos, fizeram estragos que ainda podem ser sentidos hoje e terão reflexos graves no futuro. Os produtores rurais, porta-vozes do agronegócio brasileiro, decidiram plantar menos. A estimativa da Companhia Nacional do Abastecimento (Conab) para a safra 2005/2006 indica redução de 2,2 milhões de hectares na área plantada. Os agricultores vêm ainda demandando menos insumos, o que deverá afetar os índices de produtividade. Um cenário que não se coaduna com a importância do setor. Como se não bastasse, a descoberta de focos de febre aftosa, neste final do ano, em Mato Grosso, e a resistência do Governo Lula em reconhecer que o Paraná está livre da doença têm penalizado os pecuaristas, dificultado negócios e o escoamento das produções.

O agronegócio brasileiro sobrevive hoje por mérito dos produtores. Tem um potencial gigantesco ainda a ser explorado, mas para isso o poder público precisa fazer a sua parte, mostrando-se sensível nas dificuldades, atento às fiscalizações sanitárias, claro na política interna, firme nas discussões internacionais e austero nos investimentos em novas tecnologias que garantam melhor competitividade aos produtos brasileiros. A crise vivida pelos agricultores e pecuaristas hoje, agravada pela insensibilidade do Governo Lula, mostra claramente o quanto o poder público precisa avançar. É uma via de mão dupla. O agronegócio impulsiona a economia, eleva as exportações, garante superávits, gera empregos e renda, mas para isso também precisa ser impulsionado com ações concretas, voltadas para o futuro. Só assim romperemos essa barreira.

(*) Eduardo Sciarra, do PFL, é deputado federal

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