MEIO AMBIENTE II: Reforma ambiental entra em debate
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Empresas que agridem o meio ambiente pagarão mais impostos e, em contrapartida, as companhias comprometidas com a responsabilidade socioambiental terão sua carga tributária reduzida. O cidadão que comprar um carro beberrão e poluidor terá de arcar com um IPVA mais alto do que quem preferir veículos mais econômicos. A mesma lógica vai definir as alíquotas de tributos sobre o patrimônio de casas, edifícios e fazendas.
PEC - Essas são algumas das mudanças que o sistema tributário brasileiro pode sofrer caso a Câmara dos Deputados aprove uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) apresentada em abril. A PEC 353/2009, do deputado Roberto Rocha (PSDB-MA), propõe aquela que seria a primeira "reforma tributária ambiental" do país. Ela pretende incluir na Constituição, para mais tarde serem regulamentados por leis ordinárias e complementares, princípios que nos últimos anos passaram a orientar a cobrança de impostos em vários países da Europa.
Binômio - São conceitos que, a grosso modo, podem ser resumidos em um binômio: quem polui paga mais; quem preserva paga menos. Ou nem paga - uma das alterações sugeridas pelo deputado é proibir a cobrança de impostos sobre serviços de saneamento ambiental, materiais reciclados e aparelhos antipoluentes.
Reforma verde - Em sua proposta, Rocha afirma que, nos países em que foi adotada, a "reforma verde" resultou "em fator positivo para o controle dos gases geradores de efeito estufa, a criação de empregos e o aumento da produção". Segundo ele, o aumento da receita com os "tributos verdes" compensou e justificou a queda da arrecadação com investimentos, pagamento de empregados e rendas.
Resistência - Para tributaristas e especialistas em sustentabilidade, a PEC enfrentará muita resistência e pode até não vingar, mas tem o mérito de inaugurar um debate do qual o país não pode mais se esquivar. "O mundo desenvolvido tem usado essa ferramenta com eficácia. A maior virtude da proposta é incluir esses conceitos em uma futura reforma tributária. No Brasil, eles jamais haviam sido considerados", diz Gilson Faust, da Pactum Consultoria Empresarial.
Tendência - Para Gilberto Amaral, presidente do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT), a "reforma verde" se alinha a uma tendência mundial. "É por meio do sistema tributário que haverá estímulo ao desenvolvimento sustentável. É preciso incentivar atividades socioambientais e desestimular produtos e serviços que de alguma forma tenham maior impacto sobre o meio ambiente." As sugestões da PEC são semelhantes às de um estudo apresentado ao Congresso há dois anos pelo próprio IBPT. O instituto apontou que, para fazer frente às consequências do aquecimento global - como enchentes, estiagens, queimadas e doenças -, o governo terá de arrecadar mais dinheiro justamente de quem estiver "contribuindo" para a mudanças climáticas.
Lógica - Ricardo Voltolini, diretor da consultoria paulista Ideia Sustentável, concorda com essa lógica. Lembra que ela já é aplicada, por exemplo, sobre o cigarro - que tem alta carga de impostos para inibir o consumo e também custear o tratamento de saúde de tabagistas. E afirma que, historicamente, medidas que mexam com o bolso do contribuinte são as que têm resultados mais efetivos.
Justiça - "Quando o que está em jogo é ter ar puro para respirar, solo fértil, água potável e clima estável, o governo tem de regular, sim. Na lógica econômica convencional, as empresas só dão atenção ao curto prazo, e a questão socioambiental fica de lado. Com isso, os passivos de suas atividades só serão pagos pelas gerações futuras", diz Voltolini. "Sobretaxar essas companhias é uma forma de fazer justiça. Ou elas melhoram o padrão de suas atividades ou terão de pagar mais caro, quitando a fatura desde já."
O que muda - Pela "reforma tributária ambiental" sugerida na PEC 353, alguns serviços e equipamentos passam a ser isentos de impostos. Além disso, as alíquotas de impostos sobre veículos e propriedades vão variar conforme seus impactos sobre o meio ambiente.
Contribuições - As contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse de categorias profissionais ou econômicas serão orientadas, "sempre que possível", pela "seletividade socioambiental". Suas alíquotas terão de ser fixadas conforme a "responsabilidade socioambiental das atividades desempenhadas pelo contribuinte".
Isenções - Serviços de saneamento ambiental, materiais reciclados e máquinas, equipamentos e aparelhos antipoluentes não pagarão impostos municipais, estaduais e federais.
Propriedades - Os impostos sobre propriedades rurais e urbanas (ITR e IPTU) terão alíquotas fixadas de forma a "estimular o respeito à função socioambiental da propriedade".
Veículos - As alíquotas de imposto sobre veículos (IPVA) serão fixadas conforme o consumo energético e a emissão de gases poluentes do veículo.
Repasses de ICMS - Os repasses de ICMS aos municípios terão de considerar critérios ambientais, "como manutenção de mananciais de abastecimento e unidades de conservação, existência de terras indígenas, serviço de saneamento ambiental, reciclagem e educação ambiental".
Repasses federais - Os repasses de recursos federais a estados (FPE) e municípios (FPM) terão de seguir critérios que estimulem a adoção de políticas públicas voltadas à conservação ambiental. (Gazeta do Povo)