Perda de renda do campo terá repercussão no emprego
- Artigos em destaque na home: Nenhum
Nem mesmo o início da colheita da safra de verão tem trazido um alento aos produtores rurais paranaenses. Pelo segundo ano consecutivo eles olham para suas lavouras e só enxergam os prejuízos germinarem e suas dívidas se multiplicarem. Se somarmos a quebra da safra do ano passado (6 milhões de toneladas) com a atual, o setor acumula uma redução de aproximadamente 10 milhões de toneladas, o que equivale quase a metade de uma safra de grãos do Paraná.
Em 2005 o Produto Interno Bruto do agronegócio brasileiro teve a maior
redução dos últimos 10 anos, R$ 18,08 bilhões a
menos. Em 2004 o PIB foi de R$ 533,98 bilhões e em 2005 a última
previsão era de R$ 515,9 bilhões. Quanto se refere ao Valor Bruto
da Produção (VBP) da agropecuária brasileira, esta redução
chega próximo aos R$ 20 bilhões, ou seja, 10,5% menor, passando
de R$ 188,21 bilhões em 2004 para R$ 168,53 bilhões em 2005.
Preocupado com este cenário, o presidente da Organização
das Cooperativas do Estado do Paraná (Ocepar), João Paulo Koslovski
lembra que a quebra da safra paranaense, não foi motivada apenas pela
seca, que mais uma vez assolou várias regiões do estado. Para
o dirigente, além da questão climática, outros fatores
também contribuíram de forma decisiva para a queda na rentabilidade
do setor, fazendo com que a crise bata mais forte agora à porta dos produtores.
“Uma conjunção de fatores, represados pela insensibilidade
de alguns setores da nossa economia, gradativamente começam desaguar
sobre os produtores, fazendo com que milhares deles deixem de ter renda e se
descapitalizem. Esta é uma situação que irá provocar
uma avalanche de desemprego, tanto no campo como nas cidades”, afirma.
Entres esses indicativos, Koslovski destaca o problema cambial, queda dos preços
interna e externamente, perda do poder de troca do setor, entre outros.
RADIOGRAFIA
DO SETOR:
Num levantamento recente, realizado pela Ocepar, Koslovski afirma que os reflexos
causadores de toda esta crise aconteceram em relação aos seguintes
instrumentos:
CÂMBIO - valorização do real frente ao
dólar em 39% quando comparado a janeiro de 2003 com fevereiro de 2006.
PREÇOS
- redução dos preços no mercado interno no período
de janeiro de 2003 a fevereiro de 2006 de 35,4% na soja, de 39,9% no milho e
de 33,3% no trigo.
Gráfico - Evolução dos preços recebidos pelos produtores
no mercado paranaense – jan/03 a jan/06.
Os preços
dos principais grãos produzidos no Brasil apresentam comportamento de
queda nos últimos três anos, conforme pode ser visto na figura
09. O preço da soja no período reduziu de R$ 40,51 por saca em
janeiro de 2003 para R$ 26,16 por saca, representando uma redução
de 35,4%. No caso do milho a redução foi de R$ 19,76 por saca
para R$ 11,87 por saca, ou uma queda de 39,9%. Finalmente para o trigo a redução
foi de R$ 28,93 por saca para R$ 19,29 por saca, ou uma queda de 33,3%.
Disto constata-se que houve queda superior a 30% para todos os principais grãos
da pauta de produção brasileira, situação agravada
devido a não ocorrência de queda nos custos de produção
no período.
CLIMA
- condições climáticas adversas, principalmente no Paraná,
com perda de 14% na produção de soja e 22% na produção
de milho, somente na safra 2005/06. Nas duas últimas safras as perdas
já somam 10 milhões de toneladas ou R$ 3,5 bilhões que
deixam de circular em nossa economia.
Tabela. Resumo da perda total de grãos devido à estiagem nas safras
paranaenses de 2004/05 e 2005/06.
CULTURA |
PRODUÇÃO (t) |
PERDA |
|||
inicial |
atual |
(t) |
(%) |
R$ bilhões |
|
2004/05 |
26.993.769 |
21.080.441 |
5.913.328 |
22% |
2,1 |
2005/06 |
25.408.132 |
21.546.102 |
3.862.030 |
15% |
1,4 |
TOTAL |
52.401.901 |
42.626.543 |
9.775.358 |
19% |
3,5 |
PODER DE TROCA – perda do poder de troca do produtor frente ao setor de fornecimento de fatores de produção.
A queda de renda real da soja comparando-se o resultado esperado em 2005/06 com a média de 1994/95 a 2004/05 devem girar em torno de 111%. No caso do trigo a queda de renda esperada é de 324% e no milho de 224%. Com a perda de renda os investimentos para a utilização de novas tecnologias e aquisição de fatores de produção mais modernos ficam inviabilizados, o que pode reduzir a produtividade das lavouras no médio e longo prazo.
Gráfico - SOJA X TRATOR.
O crescimento da relação de troca no período entre 2003 e 2005 foi de 67,0%, o que significou que a situação do produtor rural piorou, ou seja, enquanto em 2003 eram necessárias 2.962 sacas para o produtor adquirir um trator em 2005 este número cresceu para 4.946, levando-se em conta um trator de 100 cv de mesmo padrão.
Gráfico - SOJA X AGROQUÍMICO.
O crescimento da relação de troca no período entre 2003 e 2005 foi de 49,6%, o que significou que a situação do produtor rural piorou, ou seja, enquanto em 2003 eram necessárias 2,76 sacas para o produtor adquirir um litro de fungicida em 2005 para adquirir a mesma quantidade do insumo foram necessárias 4,13 sacas de soja. O comportamento deste agroquímico é semelhante aos demais utilizados na cultura da soja.
Gráfico - TRIGO X FERTILIZANTE
O crescimento da relação de troca no período entre 2003 e 2005 foi de 47,8%, o que significou que a situação do produtor rural piorou, ou seja, enquanto em 2003 eram necessárias 29,17 sacas de trigo para o produtor adquirir uma tonelada do formulado 05-25-25, em 2005, para adquirir a mesma quantidade do insumo foram necessárias 43,11 sacas.
Gráfico - TRIGO X AGROQUÍMICO
O crescimento da relação de troca no período entre 2003 e 2005 foi de 30,5%, o que significou que a situação do produtor rural piorou, ou seja, enquanto em 2003 eram necessárias 4,46 sacas para o produtor adquirir um litro de fungicida em 2005 para adquirir a mesma quantidade do insumo foram necessárias 5,82 sacas de trigo. O comportamento deste agroquímico é semelhante aos demais utilizados na cultura do trigo.
Gráfico - MILHO X URÉIA
O crescimento da relação de troca no período entre 2003 e 2005 foi de 28,3%, o que significou que a situação do produtor rural piorou, ou seja, enquanto em 2003 eram necessárias 50,73 sacas de milho para o produtor adquirir uma tonelada do formulado 05-25-25 em 2005 para adquirir a mesma quantidade do insumo foram necessárias 65,10 sacas.
Gráfico - MILHO X TRATOR
O crescimento da relação de troca no período entre 2003 e 2005 foi de 33,4%, o que significou que a situação do produtor rural piorou, ou seja, enquanto em 2003 eram necessárias 7.047 sacas para o produtor adquirir um trator, em 2005 este número cresceu para 9.402 sacas de milho, levando-se em conta um trator de 100 cv de mesmo padrão.
RENTABILIDADE - a rentabilidade média real dos produtores paranaenses, levando-se em conta os custos operacionais menos o preço de mercado, do período entre 1994/95 e 2004/05 sofreu uma queda de 111% na soja, 324% no trigo e 224% no milho, quando comparado com a rentabilidade média da safra 2005/06.
EXPORTAÇÕES - redução da participação das exportações do agronegócio nas exportações totais brasileiras em 8,9% no ano de 2005 em relação a 2004.
DESEMPREGO - demissões
nas agroindústrias e redução no nível de empregos
no setor rural.
As demissões serão inevitáveis em função
da queda de renda no campo. “Não só diminuirão ofertas
de vagas como haverá demissões nas agroindústrias, no campo
e também em outros setores da economia”, frisa Koslovski. Ele lembra
que os primeiros levantamentos oficiais realizados pelo IBGE (Instituto Brasileiro
de Geografia e Estatística), indicam que a taxa de desemprego das seis
principais regiões metropolitanas do país subiu para 9,2% da população
economicamente ativa em janeiro de 2006, o que representa cerca de 232 mil postos
de trabalhos a menos.
O dirigente frisa que o cenário vivido no ano passado poderá se repetir e até se agravar neste ano. Para se ter uma idéia, neste mesmo período do ano passado, entre janeiro a julho de 2005, foram ofertados 219,94 mil empregos formais na agropecuária, o que representou naquela ocasião uma queda de 19% na comparação com igual período do ano anterior (2004), quando 271,58 mil empregos foram oferecidos. Historicamente o setor é responsável pela criação de mais postos de trabalho no primeiro semestre de cada ano. Isto ocorre em virtude das colheitas de várias culturas demandarem maior contratação de mão-de-obra neste período.
O presidente da Ocepar ressalta que “os números indicam a evolução da crise no setor. Negar o atual quadro e deixar de implementar medidas emergenciais e corretivas a curto e em longo prazo poderá ser desastroso para a agricultura brasileira e para o agronegócio”. Koslovski alerta de que “a atual colheita não será suficiente para saldar o pagamento dos compromissos assumidos pelos agricultores”, por isso ele alerta para a necessidade do Governo Federal agilizar medidas emergenciais, as quais foram propostas pelo setor ao Ministério da Agricultura e Ministério do Planejamento no início do mês e que começam a se configurar na chamada “MP do Bem” para a agricultura e anunciadas no último dia 22 de fevereiro pelo ministro Roberto Rodrigues.
Entre os principais pontos do estudo da Ocepar, como já pudemos perceber na série de gráficos, chama atenção para a queda drástica na rentabilidade média do produtor de soja. Os cálculos da entidade levaram em conta os custos operacionais reais (corrigidos pelo índice de inflação IGP-DI) menos o preço de mercado entre o período 1994/1995 e 2004/2005 que era de R$ 11,82 por saca do produto. Na atual safra, a rentabilidade passou a ser negativa, ou seja, menos R$ 1,34 por saca de soja colhida, uma queda de renda para os produtores de 111%, para o milho de menos 224% e para o trigo, situação pior, menos 324% em uma década apenas.
Outra prova de que os reclamos do setor precisam ser ouvidos é o crescimento da relação de troca. O estudo da Ocepar aponta que no ano de 2003, para um produtor adquirir um trator de 100 cv, eram necessárias 2.962 sacas de soja, no ano passado esta relação saltou para 4.946 sacas, um aumento em apenas três safras de 67%. No caso de agroquímicos - 1 litro de fungicida, por exemplo - esta relação aumentou em quase 50% no mesmo período. Em 2003 eram necessárias 2,76 sacas de soja, em 2005 foram 4,13 sacas. Para outras culturas o cenário não foi diferente. No caso do trigo, a relação de troca para aquisição de uma tonelada de fertilizante era de quase 30 sacas em 2003 e, no ano passado, 43,11 sacas, um aumento de 47,8%. O crescimento da relação do milho também ficou nos mesmos patamares. Em 2003 para um produtor adquirir uma tonelada do formulado 05-25-25 de uréia, eram necessárias 50,73 sacas de milho, em 2005 foram 65,10 sacas a mais (28,3%) .
PROPOSTAS:
No documento entregue as autoridades, o Sistema Ocepar pede ao governo a implementação
de medidas em curto prazo, que seriam no âmbito conjuntural e a longo
prazo, medidas estruturais. De imediato o setor necessita de uma prorrogação
das dívidas de custeio da safra 2005/2006 junto ao sistema nacional de
crédito rural e aos fornecedores de insumos. Prorrogação
das parcelas dos investimentos que vencem em 2006; prorrogação
da parcela do FAT Giro Rural que vencem neste ano. Além disso, o setor
solicita a antecipação da locação de recursos para
custeio da safra de inverno e suplementação de recursos no orçamento
do Ministério da Agricultura para viabilizar a comercialização
da safra 2005/2006 em função dos baixos preços recebidos
pelo produtor, dentre outros.
Longo prazo (estruturais) – Criação de um programa de renegociação das dívidas dos produtores (Pesa, Pesinha, Recoop, Securitização, FAT Giro Rural, Investimentos Funcafé, etc.) para um perfil de longo prazo, buscando dar condições ao produtor de efetuar o pagamento de seus débitos num horizonte viável para que possa quitar seus débitos. “Os produtores querem pagar suas dívidas, apenas solicitam condições para tal”, lembra Koslovski.
Seguro rural que garanta produção de forma que os produtores possam produzir sem risco de perderem tudo com adversidade climáticas. Seguro com subvenção de seu prêmio pelo Tesouro Nacional, conforme já previsto em Lei. Política de produção que envolva assistência técnica capacitação de produtores e técnicos de cooperativas e empresas, defesa sanitária animal e vegetal. Política de sustentação de preços (garantia de preço mínimo) política de crédito – suficiente e acessível de custeio comercialização e investimento. Política de exportação, infra-estrutura, revisão da política tributária, previdenciária e trabalhista.
Sem o apoio direto do Governo, esta situação, vivida pelo homem do campo, se refletirá, em longo prazo, no aumento do êxodo rural e, em curto prazo, atingirá em cheio a economia dos municípios. Sem dinheiro, o agricultor não compra, o comércio não vende e as empresas demitirão seus funcionários. Esta situação já vem sendo sentida no interior do Paraná, onde várias empresas estão cancelando investimentos e demitindo pessoal.
O líder cooperativista destaca que o Governo Federal precisa urgentemente tomar ciência de tal gravidade e viabilizar uma política emergencial para o setor, afinal, lembra Koslovski “o problema está deixando de ser conjuntural e se transformando em estrutural, fato este que comprometerá diretamente toda a economia brasileira, especialmente a nossa balança comercial”, alerta.