ENDIVIDAMENTO: Senado aprova renegociação das dívidas de 2,8 milhões de agricultores

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Depois de mais de ano de negociações com lideranças do setor rural e parlamentares, o Plenário do Senado fez na noite de quarta-feira (27.08) a última votação do projeto que autoriza o governo a renegociar cerca de R$ 75 bilhões de dívidas de 2,8 milhões de agricultores. Esta é a quarta vez que o governo renegocia dívidas de produtores desde 1994. O Senado manteve todas as mudanças que os deputados haviam feito na Medida Provisória (MP) 432/08, agora transformada no Projeto de Lei de Conversão (PLV) 22/08. Com isso, a proposta vai à sanção do presidente da República. A matéria foi aprovada pelos senadores em votação simbólica. "Foi um passo importante porque envolve a renegociação de 80% das dívidas agrícolas, algumas contraídas pelos produtores ainda nas décadas de 80 e 90", comenta o presidente do Sistema Ocepar, João Paulo Koslovski, que participou do Grupo de Trabalho que conduziu as discussões sobre a renegociação dos passivos rurais.

O que será renegociado - O PLV 22/08 possui 61 artigos e 11 anexos disciplinando benefícios a cerca de 340 mil famílias.  O gerente técnico e econômico do Sistema Ocepar, Flávio Turra, explica que o projeto autoriza a renegociação de 32 tipos diferentes de financiamento rural, conforme a fonte de crédito, o tipo de mutuário, a condição de adimplente ou inadimplente e a existência de programas específicos, entre outros fatores. "A proposta concede descontos que vão de 5% a 45% sobre o saldo devedor para quem fizer pagamentos antecipados e os juros variam de 3% a 12%", esclarece. Essas dívidas foram tomadas por pequenos agricultores familiares, assentados da reforma agrária, médios produtores e agricultores empresariais. A proposta  contempla ainda estímulos para liquidação de dívidas de operações de Crédito Rural (inclusive inscritas na Dívida Ativa da União), do Funcafé, do Programa de recuperação da Lavoura Cacaueira nas suas etapas de 1 a 4, das operações de Pronaf Custeio das Safras 2003 a 2006 prorrogadas, operações destinadas a investimento agropecuário, lastreadas em recursos repassados pela Financiadora de Estudos e Projetos - FINEP, operações de crédito rural contratadas com recursos do Fundo Constitucional de Financiamento do Norte - FNO, ao amparo do Programa de Apoio ao Desenvolvimento do Extrativismo Vegetal - PRODEX, do Programa de Apoio à Pequena Produção Familiar Organizada - PRORURAL ou do FNO-Especial.

Beneficiados - "Essa é a mais ampla renegociação de dívidas de agricultores feita até hoje no país. O projeto está alterando 15 leis que tratam de financiamentos rurais", informou o senador Neuto de Conto (PMDB-SC), relator do projeto e presidente da Comissão de Agricultura e Reforma Agrária. Ele disse que o governo concordou em estender a renegociação aos produtores de frutas e de camarão, o que será feito em novas medidas provisórias.

Taxa de juros -  "O ponto mais polêmico foi a substituição da taxa de juros SELIC (hoje em torno de 13% ao ano) pela Taxa de Juros de Longo Prazo - TJLP (6,25%) para os cálculos de encargos e descontos", afirma o assessor tributário do Sistema Ocepar, Marcos Antonio Caetano.   O governo não aceita a mudança na taxa de juros, alegando que, por lei, todas as dívidas em execução são corrigidas pela Selic. O senador Neuto de Conto tentou negociar uma alternativa, mas ouviu afirmações de que o presidente da República deverá vetar essa alteração de indexador. O Senado manteve a TJLP, pois, se introduzisse um índice alternativo, o projeto teria de retornar ao exame dos deputados, atrasando ainda mais a renegociação dos agricultores. Dos 2,8 milhões de agricultores beneficiados pela renegociação, 31 mil estão com dívidas em execução. Eles representam apenas 1,1% de todos os contratos, mas o valor passa de R$ 7 bilhões, ou seja, cerca de 10% de toda a renegociação.

Incentivo - O governo entende que a renegociação incentivará os produtores, levando-os a aumentar sua área de plantio em um momento que os estoques mundiais de alimentos encontram-se baixos e os preços apresentam elevação, comparando-se com os últimos anos. O senador Marconi Perillo (PSDB-GO) afirmou, durante o debate da matéria, que os agricultores não tiveram condições de pagar suas dívidas por vários motivos, entre eles estiagens, câmbio desfavorável, preços baixos de cereais e oleaginosas e aumentos pesados de fertilizantes. Só este ano, ressaltou o senador, os fertilizantes já subiram 130%. "Enquanto em outros países o governo concede subsídios para seus agricultores, aqui eles têm que empenhar até sua terra, sua moradia, para conseguir financiamentos. O agricultor brasileiro é sempre penalizado e recebe pouco apoio do governo para enfrentar seus riscos", acrescentou Perillo.

Fertilizantes - Já o senador Gilberto Goellner (DEM-MT) observou que os agricultores contarão com um alongamento de suas dívidas, mas não haverá nenhum "perdão de dívida". Ele criticou a inércia do governo em combater os "absurdos aumentos de preços de fertilizantes", informando que houve caso de aumento de até 500%. Disse ainda que a média de juros pagos pela agricultura brasileira é de 15%, contra 2% em outros países. O senador Neuto de Conto informou que, após a sanção do presidente da República, o Conselho Monetário Nacional irá se reunir para aprovar normas a serem expedidas aos bancos que operam pelo governo com crédito rural. Só depois disso é que os agricultores deverão procurar as agências para aderir à renegociação.

Veja outras propostas que constam no projeto de renegociação das dívidas durais. As medidas constarão em resoluções do Conselho Monetário nacional (CMN) e Banco Central:

- A MP autoriza a adoção de medidas de estímulo à liquidação ou regularização de dívidas originárias de operações de crédito rural, renegociadas com base no § 3º do art. 5º da Lei nº 9.138/1995, e repactuadas nos termos da Lei nº 10.437/2002, ou do art. 4º da Lei nº 11.322/2006.

- Para a liquidação destas dívidas em 2008, 2009 ou 2010 de operações adimplidas, ou renegociadas, concede descontos percentuais de 5% a 45%, mais desconto de valor fixo, após desconto percentual, nos montantes de R$ 1.575,00 a R$ 15.325,00. Quanto maior a dívida menor o desconto.

- Para a liquidação de operações inadimplidas, dispensa da correção pela variação do preço mínimo, de que tratam os §§ 3º e 5º do art. 1º da Lei nº 10.437/2002, e os incisos III, V e VI do caput do art. 4º da Lei nº 11.322/2006, referente às parcelas vencidas, ajustando o saldo devedor vencido, pela retirada dos encargos por inadimplemento e corrigindo-se o saldo de cada parcela pelos encargos de normalidade até a data do respectivo vencimento contratual, pela aplicação do Índice de Preços ao Consumidor Amplo - IPCA, divulgado pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE, mais 6% (seis por cento) ao ano pro rata die, calculados a partir da data de vencimento contratual de cada parcela, até a data da liquidação.

- Como estímulo à liquidação ou renegociação das operações ao amparo do Programa de Revitalização de Cooperativas de Produção Agropecuária - RECOOP, de que trata a Medida Provisória nº 2.168-40/2001, que foram contratadas com risco, integral ou parcial, da União ou dos Fundos Constitucionais de Financiamento, nas operações adimplidas, concede desconto de 15% sobre o saldo devedor para liquidação em 2008, e para liquidação em 2009 ou em 2010, concede desconto de 12% (doze por cento) ou 9% (nove por cento), respectivamente.

- As novas regras estendem o prazo final para pagamento das dívidas de agricultores em todo o Brasil, destacando-se os atingidos pela estiagem de 2005, alcançando cerca de 360 Municípios de Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, Mato Grosso do Sul e Mato Grosso.

- Ainda, dentre os muitos pontos de negociações, a Medida assegura aos mutuários de operações de Crédito Rural, a revisão e redução (em caso de excesso) de garantias, e das exigências a serem cumpridas pelo mutuário, como a confissão irrevogável do total dos débitos e a desistência de todas as ações judiciais sobre a dívida renegociada, tendo em conta a autorização, à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, para suspender as ações de cobrança contra quem aderir à renegociação, considerando que há cerca de 31 mil operações cujos mutuários têm até mesmo o CPF inutilizado, inviabilizando a venda de terras para pagamento de dívidas.

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