TRIGO: Preço alto e safra menor fazem gasto explodir
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A sangria do trigo nas contas da balança comercial, acentuada no mês de fevereiro, deve continuar. Segundo a Secretaria de Comércio Exterior, o produto foi um dos três a levar a balança comercial a registrar - entre 18 e 24 deste mês - ao primeiro déficit semanal desde 2002. Os gastos médios diários deste mês superam em 147% os de igual período de 2007. A causa da pressão do trigo e seus derivados nas contas nacionais passa não apenas por motivos externos, onde os produtos estão com preços recordes, mas também por um certo recuo da cultura no país.
Importação - No cenário externo, os números não deixam dúvidas de quanto o país ainda vai pagar caro pelo cereal. Em janeiro de 2005, os preços médios da tonelada de trigo estavam em US$ 120 na Bolsa de Chicago. No mês de janeiro de 2008, subiram para US$ 348. Mais 190%. Além dessa forte puxada de preços, outros números perigosos rondam o produto, diz Fernando Muraro, da Agência Rural. Os estoques mundiais, que no início da década eram suficientes para 130 dias de consumo, caíram para apenas 66. No ano passado, o Brasil gastou US$ 2,33 bilhões com as importações de trigo e farinhas, valor 43% superior ao de 2006. Neste ano, mesmo com a previsão de safra interna maior, os gastos devem continuar crescendo devido à forte valorização dos preços externos.
Argentina - Os custos com as importações cresceram ainda devido à política interna da Argentina, que freou as exportações do cereal, incrementando as de farinha, com maior valor agregado. Neste ano, as compras externas podem chegar a 1 milhão de toneladas - 4.300 em 2004. Essa evolução dos preços no mercado externo fez o trigo voltar a atrair a atenção dos produtores. A área a ser plantada no Paraná, o principal produtor nacional, deve aumentar em pelo menos 20% neste ano e superar 1 milhão de hectares. Os produtores estão animados com esse cenário bastante favorável, mas ainda olham o trigo com certa preocupação.
Plantio caro - "O trigo é uma cultura cara, complicada e arriscada", segundo o produtor paranaense Roberto Pozzi. Nesta safra de inverno, ele vai destinar apenas 35% da área para o trigo e as atenções maiores vão continuar com o milho safrinha. Pozzi diz que gostaria de plantar mais trigo, mas as próprias condições dadas pelo governo levam os produtores para o milho. Sempre em busca de preços mínimos maiores, os produtores não têm muito a reclamar neste ano. Enquanto o mínimo está em R$ 24 por saca, o mercado paga R$ 36. Na avaliação dos produtores, no entanto, as culturas de inverno deveriam ter um seguro subvencionado, como ocorre nas de verão, o que levaria mais produtores ao trigo. Mas não é apenas a política do governo que deixa dúvidas nos agricultores. Pozzi diz que, no ano passado, ganhou dinheiro com o produto, mas já chegou a ficar seis meses com trigo e não apareceu comprador.
Problemas - Além dessa ausência dos moinhos quando a oferta interna é boa, Pozzi critica a abertura de outros mercados, pelo governo, quando o preço fica bom para o produtor. Ele se refere à retirada da Tarifa Externa Comum adotada pelo governo neste ano para suprir a demanda interna com oferta de trigo de países fora do Mercosul. "Não há intenção dos moinhos em baixar o preço do trigo nacional", diz Lawrence Pih, do moinho Pacífico. Os moinhos buscam o produto de melhor qualidade e com melhor preço onde encontrar. Além disso, há uma limitação do próprio governo nos empréstimos para a compra do produto nacional, o que prejudica os produtores.
Contradição - Para o analista José Pitoli, "o único empecilho para o plantio do trigo neste ano será a falta de sementes". Mas Eugênio Bohatch, diretor-executivo da Apasem (Associação Paranaense de Produtores de Sementes e Mudas), diz que semente não faltará. As indústrias estão preparadas para 1 milhão de hectares. Além disso, muitos produtores guardam a própria semente, acrescenta. Quanto aos preços, Bohatch diz que "o valor das sementes não acompanhou a forte puxada de preços que o trigo teve nos mercados interno e externo: o quilo varia de R$ 0,90 a R$ 1,20, dependendo da variedade. (Folha de S. Paulo)